A pandemia trouxe muitas mudanças, no mundo do trabalho, acadêmico, na forma como nos relacionamos, compramos e uma série de outras atividades que hoje seguem o protocolo de um “novo normal”.
A despedida de familiares e amigos queridos, vítimas da Covid-19 também mudou e o número de pessoas que sucumbiram à doença só aumentou. Esse movimento teve um impacto imediato nos novos pedidos para abertura de processos de inventários, com um aumento de 44%, de março a setembro de 2020, conforme constatou o Colégio Notarial do Brasil – Conselho Federal (CNB/CF).
Nos números levantados pela entidade comparado ao mesmo período do ano passado, tal aumento está totalmente relacionado com o volume de mortes provocadas pelo novo coronavírus.
Vale destacar que o País, em números absolutos, saltou dos 10.009 processos de partilha de bens em março, para 14.366 em setembro, maior número mensal registrado em 2020 e chegou a 80.605 inventários no período. Esse recorde de setembro é atribuído ao prazo que a família tem para dar entrada ao procedimento extrajudicial de até 60 dias após a data do óbito.
Na compilação dos dados, o estado de São Paulo foi o responsável por mais de 41% do total de inventários, ou mais de 33 mil atos realizados no período do levantamento. Só no mês de setembro foram mais de 6 mil inventários abertos na capital paulista. O segundo estado com mais inventários realizados, 1.692, foi o Paraná; seguido de Minas Gerais, que passou de 1.112 escrituras para 1.508, um aumento de 36%; Rio Grande do Sul, com 1.442 e Santa Catarina, com 1001 casos.
Esses cinco estados somaram 11.717 atos de inventários, representando 81,5% do total do País no referido mês.
Possível aumento de imposto também acelerou pedidos de inventários
Para o Colégio Notarial do Brasil – Conselho Federal, outro argumento que explica o aumento dos procedimentos para partilha de bens e dívidas entre herdeiros, além da pandemia, é o temor que projetos de lei de governos estaduais majore a alíquota do Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doações (ITCMD), que incide sobre a transmissão de propriedades no ato de inventário. Esse percentual varia de estado para estado.
O preço a ser pago, geralmente é calculado sobre o valor venal dos bens e quitado em até 180 dias da data do óbito. É preciso atenção redobrada para não perder os prazos legais obrigatórios para a abertura do inventário. Caso contrário pode ser incidida multa e a possibilidade de que as alíquotas do imposto estadual sofram reajustes em razão da atual crise fiscal..
Procedimento extrajudicial é o mais indicado quando não há impedimentos
O processo de sucessão pode ser mais um instrumento de dor na vida de quem perdeu um ente querido. É nesse momento que se inicia o inventário, instrumento que transmitirá aos herdeiros o direito de posse e administração dos bens.
É um processo judicial burocrático, longo e que pode envolver altos custos até a efetiva partilha. Como alternativa, desde 2007 a lei nº 11.441 instituiu o inventário extrajudicial. A ferramenta foi delegada aos cartórios de notas dando-lhes poder de lavrar escrituras públicas de separação, divórcio e inventário. Com a lei o procedimento tornou-se indiscutivelmente mais célere para os envolvidos.
Agora, aquele inventário que só podia ser concluído com um acompanhamento de um juiz e que poderia se estender por anos, pode ser concluído diretamente no cartório, por escritura pública, podendo demorar apenas alguns meses.
Somente em três situações o inventário judicial se torna imperativo diante do extrajudicial: quando há um testamento deixado pelo falecido; quando os herdeiros divergem quanto a partilha e; quando há interessados incapazes (menores ou interditados).
Por ser mais rápido e menos custoso, o modelo extrajudicial é o procedimento mais recomendável quando não há impedimentos e tem sido adotado com mais frequência, como mostra o levantamento do CNB/CF. Todavia, tem prazo previsto no artigo 611 do Código de Processo Civil, para dar entrada no processo, que deve acontecer dentro de dois meses, contando da data da abertura da sucessão, ou seja, contado a partir da data do óbito.
Requisitos e documentação necessária para o processo extrajudicial
Para a realização de inventário extrajudicial é preciso que todos os herdeiros sejam maiores ou capazes e devem todos acordar com a partilha. É pré-requisito que o falecido não tenha deixado um testamento e na escritura precisa constar, ao menos no início, a participação de um advogado, podendo ser comum a todos os herdeiros ou não. Depois um cartório de notas precisará ser definido para a efetivação do processo.
Dentre a documentação necessária, destaca-se a certidão comprobatória de inexistência de testamento expedida pelo Colégio Notarial do Brasil e a certidão negativa da Receita Federal e Procuradoria Geral da Fazenda Nacional, além dos documentos pessoais de herdeiros e cônjuge, incluindo certidão de nascimento ou casamento e pacto antenupcial se houver; do advogado, como Carteira da OAB, informação sobre estado civil e endereço do advogado; documentos pessoais do falecido e certidão de óbito; e informações sobre bens, dívidas e obrigações, descrição da partilha e pagamento do ITCMD.
Também são exigidos documentos relacionados aos bens imóveis, como certidão de ônus expedida pelo Cartório de Registro de Imóveis (atualizada até 30 dias), carnê de IPTU, certidão negativa de tributos municipais incidentes sobre imóveis, declaração de quitação de débitos condominiais; e de bens móveis, como documento de veículos, extratos bancários, certidão da junta comercial ou do cartório de registro civil de pessoas jurídicas, notas fiscais de bens ou joias.
Tipos de inventários judiciais
O Inventário Judicial é previsto nos artigos 610 a 667, contudo, obedecem a ritos distintos, como no Inventário Negativo, quando o falecido não deixa bens para serem inventariados e que acontece em duas situações: quando é exigido que o cônjuge sobrevivente faça o inventário e a partilha, se tiver a intenção de se casar novamente, sob pena de torna-se obrigatório o regime da separação de bens (como previsto no artigo 1.523, I, do Código Civil); e se o falecido só deixar dívidas e, nesse caso, os herdeiros deverão fazer o inventário para demonstrar aos credores que não existem bens para a satisfação do seu crédito.
O Inventário Solene (ou pelo rito tradicional) é regulado nos artigos 610 a 658 do Código de Processo Civil e o Inventário pelo Rito de Arrolamento Sumário, previsto no artigo 659 ao 663, abrange bens de qualquer valor, devendo os interessados serem capazes e, concordarem com a partilha, que será homologada de plano pelo juiz mediante a prova de quitação dos tributos.
Já o Inventário de Rito Comum, previsto no artigo 664 ao 666 é destinado para quando os bens do espólio sejam de valor igual ou superior a 1.000 salários-mínimos. Tem um procedimento mais longo, com várias fases como a petição de abertura, nomeação do inventariante apresentando primeiras declarações, citação dos herdeiros e por fim, as últimas declarações.
Desburocratizar para não judicializar
Fato é que a Lei n° 11.441 de 2007, que instituiu os serviços de inventário, partilha, separação e divórcio por escritura pública em Cartório de Notas, foi fundamental para desjudicialização e desburocratização de serviços no Brasil e impactou positivamente os cidadãos.
A Lei completou 13 anos no dia 04 de janeiro desse ano e até aquele mês, segundo o Colégio Notarial do Brasil (CNB), já tinham sido realizados mais de 2,4 milhões de atos.